EQUIPAMENTOS COMUNITÁRIOS
A vila dos Catadores Ciclistas
Bruna Ruperto Camillo
As caçambas da Asa Norte do Plano Piloto recebem muitos visitantes ao longo do dia. Entre eles estão os catadores ciclistas do cerrado. Este grupo de catadoras e catadores de resíduos sólidos recicláveis ocupa, há mais de vinte anos, as áreas próximas ao bairro de classe alta Setor Noroeste.
Eles recolhem tanto ali quanto na Asa Norte os materiais descartados pelos moradores da região. Realizam seu trabalho fazendo longas rotas em bicicletas cargueiras adaptadas para este fim. Em anos de expertise, estes trabalhadores desenvolveram um meio de reciclagem eficiente, de baixo impacto e sustentável em sentido amplo. A sustentabilidade é evidente nas técnicas, nas ferramentas, nas práticas, na produção e na autogestão dessa comunidade composta de 40 famílias.
A Vila dos Catadores Ciclistas é um projeto básico para um espaço de trabalho construído que atenda às necessidades da produção e da reprodução da vida destes trabalhadores. Entendendo que para este grupo o desenvolvimento da dimensão do trabalho procede do desenvolvimento da vida doméstica e vice-versa, ou seja, que não há dissociação de ambas as partes, este projeto buscou reunir e organizar em um mesmo espaço os ambientes de moradia e da reciclagem porta a porta. Tal arranjo partiu da avaliação dos padrões espaciais encontrados na ocupação, nos resultados dos questionários aplicados e das oficinas de processo participativo realizadas com os catadores.
O resultado formal do espaço reflete a racionalidade do modo de trabalho específico deste grupo, alternativo ao modelo convencional para galpões de reciclagem. Por um lado, as tarefas da reciclagem exigem a definição de áreas apropriadas para o trabalho. Por outro, a flexibilidade do espaço é fundamental para a comunidade, estruturada por pequenos núcleos familiares autônomos organizados em grandes famílias. O resultado é um sistema de módulos que atendem às distintas atividades da catação mantendo, ao mesmo tempo, os diferentes fluxos de circulação e as condições para as transformações constantes.
O trabalho tem por finalidade a elaboração do projeto de uma cozinha – escola para o coletivo de mulheres “As do Cerrado”, assentadas do Oziel Alvez III, em Planaltina-DF. Trata-se de um espaço destinado à produção de produtos alimentares para venda que são oriundos da produção agroecológica das mulheres, sendo assim, leva em consideração a relação entre território, plantio, produção e venda. Este projeto de extensão se insere no grupo de pesquisa Periféricos – Trabalhos Emergentes, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília, FAU/UNB em parceria com a Incubadora de Cooperativas Populares– Economia Solidária e Tecnologia Social no Edital 36/2018 CNPQ/MCTIC/MDS Tecnologia Social (Fundo rotativo solidário como tecnologia social para redes de mediadores/formadores territoriais de políticas integrativas trabalho, habitat & ambiente entre grupos sob risco social no distrito federal – DF) e o Núcleo de Política, Ciência, Tecnologia e Sociedade do CEAM.
A inquietação que dá origem a esse trabalho parte da premissa de que nossa má alimentação contemporânea tem consequências não apenas em nossos corpos, mas também em uma escala macro, de abrangência territorial e sistêmica, sendo o questionamento inicial da pesquisa de que forma uma produção consciente e ecológica modificaria o espaço desde o nível territorial até o arquitetônico.
A alimentação neste trabalho é abordada não apenas como nutrição, mas como uma atitude ambiental, um ato político e social. Tudo o que comemos participa de uma rede de implicações extensas, gerando externalidades: a obtenção direta com um produtor sem atravessadores, a compra de produtos industrializados/processados ou a quantidade de rejeitos envolvidos nesse processo, por exemplo, são aspectos de fundamental importância mas que somente tangenciam o tema da alimentação. Por causa dessa rede comple a, todo alimento possui um impacto ambiental e social que precisa ser discutido e conscientizado pelos consumidores, que é toda a humanidade.
Espaço sustentável - 100 Dimensão
Gabriela Heusi
A partir de estudos relacionados às políticas destinadas aos trabalhadores de reciclagem de resíduos, práticas sustentáveis e permaculturais; esse trabalho visou inserir o contexto dessas famílias na produção de um projeto participativo de arquitetura e paisagismo. Levando em consideração o público e espaço já existente, buscou-se valorizar ao máximo soluções alternativas para contornar os desafios existentes atualmente.
Com o consumo desenfreado vivenciado nos dias atuais, diariamente toneladas de detritos são produzidas e dificilmente chegam a uma finalidade adequada. Tendo em mente que a implantação de um modelo de gestão de resíduos sólidos urbanos no Brasil aconteceu somente em 1994, questões como lógica de produção e descarte, poluição, reciclagem e inclusão social só começaram a ganhar notoriedade recentemente. Esse descaso com o setor da reciclagem e atraso em tomar atitudes concretas, fez com que inúmeras consequências refletissem diretamente na qualidade de vida dos trabalhadores do ramo da reciclagem e no meio ambiente.
Acreditando em uma sociedade futura que se preocupe com o meio ambiente, é possível notar o grande potencial em investir na educação das crianças desde os primeiros anos de idade, e que práticas como: separar resíduos domiciliares e ter conhecimento sobre sua destinação correta, se tornem naturais em suas rotinas. Essa conscientização além de contribuir com o trabalho de inúmeros trabalhadores do ramo da reciclagem, também estaria ajudando diretamente no prolongamento da vida útil de aterros sanitários, que representam um grande gasto dos cofres públicos, investimento que poderia ser convertido na construção de escolas, hospitais entre vários outros equipamentos urbanos.
Com o potencial da educação ambiental no panorama atual e percebendo a carência desse serviço de ensino sustentável, foi pensado o centro sustentável “100 Dimensão”, um espaço que pudesse fornecer essa conscientização ambiental de forma prática e acolhedora.
O objetivo principal desse projeto é gerar, em conjunto com a comunidade local, um projeto de adaptação dos galpões existentes, ambientes novos a serem criados destinados à prática de novas atividades, áreas para alojamento dos trabalhadores durante a semana e espaços para educação sustentável. Além de um projeto de paisagismo para a área externa que inclui práticas permaculturais.
Dentre os objetivos desejados pelos trabalhadores está a criação de um ambiente focado no consumo consciente, um centro sustentável que aborde as quatro dimensões morfológicas da sustentabilidade (social, econômico, cultural e ambiental); tendo principalmente a intenção de valorizar e reafirmar os potenciais encontrados na prática de reciclagem, de forma a conscientizar o maior número de pessoas possível. Requalificando o espaço físico, promovendo a educação ambiental de forma a se tornar um polo multiplicador de práticas sustentáveis.
A metodologia utilizada para desenvolver esse trabalho, seguirá como base a estruturação desenvolvida pelo grupo periférico, organizado pela professora Liza Andrade, na Universidade de Brasília. Para definir melhor as diretrizes que guiarão o projeto de habitação e educação na cooperativa “100 dimensão”, será realizado um diagnóstico morfológico da área de estudo baseado nos padrões desenvolvidos por Christopher Alexander em “Uma linguagem de padrões”, bem como os métodos encontrados no livro “Avaliação da qualidade da habitação de interesse social” (autores: Amorim, C.; Ikeda D.; Andrade L.; Buson M.; Lemos N. e Zanoni V.).
De acordo com cada expectativa social será realizada então uma avaliação da área de estudo. As dimensões morfológicas da sustentabilidade que serão abordadas nesse projeto serão quatro: social, ambiental, econômica e cultural. A partir dessas análises e de acordo com as dimensões morfológicas, serão elaboradas soluções alternativas traduzidas em códigos ou padrões para serem trabalhados em conjunto com a comunidade.
O processo participativo é uma das principais ferramentas utilizadas nesse projeto. Colocando o usuário no centro do processo de projetação, faz com que a arquitetura seja orientada de acordo com as necessidades dos trabalhadores da cooperativa. No decorrer do semestre foram programadas visitas, com o intuito de familiarizar os cooperados com o projeto, aplicar questionários e dinâmicas, a fim de levantar e organizar informações que serão interpretadas de acordo com os padrões de Alexander e da literatura “Avaliação da qualidade da habitação de interesse social”. Essas análises e padrões encontrados serviram para nortear tomadas de decisão de projeto, juntamente com a comunidade.
O centro sustentável ‘100 dimensão’ é um complexo de aprendizagem ecológica, um projeto de intervenção na área dos galpões já existentes de uma Cooperativa de reciclagem de resíduos sólidos. O projeto surgiu da necessidade de cooperados que buscavam ressignificar seus ofícios e modo de vida e valorizar os aprendizados que obtiveram no decorrer dos anos com o trabalho de reciclagem. Esse complexo contará com novos espaços voltados à conscientização sustentável de crianças de escolas públicas e privadas do Distrito Federal, bem como produção de conteúdo online relacionado à reciclagem e sustentabilidade.
“Feira da Cei – Da eira à beira”
Daniel Melo
“Feira da Cei – Da eira à beira” propõe, por meio de processo participativo com jogo de padrões (ALEXANDER e ANDRADE), a requalificação da Feira Central de Ceilândia e de seu entorno imediato – envolvendo a Caixa d’Água, patrimônio histórico do Distrito Federal. O trabalho reúne, evidencia e integra os valores históricos e simbólicos do centro e tem a intenção de provocar a transformação da cena da cidade, ressignificando o lugar e conferindo-lhe identidade e valor de memória arquitetônica – da eira à beira, do pátio à cobertura –, inserindo-o no imaginário popular e no circuito turístico e cultural da metrópole Brasília.
Veja também:
CENTRO SOCIOCULTURAL DA VILA PLANALTO
Débora De Boni
Localizada no centro do poder nacional, entre a Esplanada dos Ministérios, o Palácio da Alvorada e o Setor de Clubes Norte, a Vila Planalto é um bairro exceção de Brasília. Surgiu como acampamento na década de 1950, para abrigar os operários da construção civil que ergueriam a nova capital. Nasceu de um projeto, masfoi se desenvolvendo de forma espontânea, de improviso. Com o passar dos anos e das lutas, alcançou a legitimidade e tornou-se um testemunho histórico e um contra-ponto à rigidez do desenho do Plano Piloto.
A motivação para o estudo de vilas surgiu no decorrer do curso de graduação, ao observar a relação das pessoas com seus
espaços e a possibilidade de intervenção a partir do reconhecimento das particularidades que as identifica como comunidade. Essas relações permeiam as discussões no campo do patrimônio e do urbanismo contemporâneo. A identificação das demandas apontadas pela própria comunidade propiciou o ponto de partida para o desencolcimento deste projeto, sendo a Vila Planalto, de particular interesse, cujo local reuniu fatores importantes - organizações sociais, demandas comunitárias e fatos históricos relevantes. Além disso, a escala urbana com características de bairro, permite um estudo mais aproximado e detalhado do objeto escolhido como tema.